No livro Contos Gauchescos, de Simões Lopes Neto há um texto muito interessante que leva o título: “ARTIGOS DE FÉ DO GAÚCHO” que são 21 provérbios baseados em observações cotidianas dos gaúchos do século XIX, que é narrado pelo Blau Nunes.

O texto abaixo está escrito conforme está no livro por isso, tem que relevar a forma que está escrito, por exemplo termos como vancê (você), confira.

Artigos de fé do gaúcho
Muita gente anda no mundo sem saber pra quê: vivem porque vêem os outros viverem. Alguns aprendem à sua custa, quase sempre já tarde pra um proveito melhor. Eu sou desses. Pra não suceder assim a vancê, eu vou ensinar-lhe o que os doutores nunca hão de ensinar-lhe por mais que queimem as pestanas deletreando nos seus livrões. Vancê note na sua livreta:
– 1º. Não cries guaxo: mas cria perto do teu olhar o potrilho pro teu andar.
– 2º. Doma tu mesmo o teu bagual: não enfrenes na lua nova, que fica babão; não arrendes na miguante, que te sai lerdo.
– 3º. Não guasqueies sem precisão nem grites sem ocasião: e sempre que puderes passa-lhe a mão.
– 4º. Se és maturrango e chasque de namorado, mancas o teu cavalo, mas chegas; se fores chasque de vida ou morte, matas o teu cavalo e talvez não chegues.
– 5º. A maior pressa é a que se faz devagar.
– 6º. Se tens viajada larga não faças pular o teu cavalo; sai ao tranco até o primeiro suor secar; depois ao trote até o segundo; dá-lhe um alce sem terceiro e terás cavalo para o dia inteiro.
– 7º. Se queres engordar o teu cavalo tira-lhe um pêlo da testa todas as vezes da ração.
– 8º. Fala ao teu cavalo como se fosse a gente.
– 9º. Não te fies em tobiano, nem bragado, nem melado; pra água, tordilho; pra muito, tapado; mas pra tudo, tostado.
– 10º. Se topares um andante com os anelos às costas, pergunta-lhe — onde ficou o baio?…
– 11º. Mulher, arma e cavalo do andar, nada de emprestar.
– 12º. Mulher, de bom gênio; faca, de bom corte; cavalo de boa boca; onça, de bom peso.
– 13º. Mulher sardenta e cavalo passarinheiro… alerta, companheiro!…
– 14º. Se correres eguada xucra, grita; mas com os homens, apresilha a língua.
– 15º. Quando dois brincam de mão, o diabo cospe vermelho…
– 16º. Cavalo de olho de porco, cachorro calado e homem de fala fina… sempre de relancina…
– 17º. Não te apotres, que domadores não faltam…
– 18º. Na guerra não há esse que nunca ouviu as esporas cantarem de grilo…
– 19º. Teima, mas não apostes; recebe, e depois assenta; assenta, e depois paga…
– 20º. Quando ‘stiveres pra embrabecer, conta três vezes os botões da tua roupa…
– 21º. Quando falares com homem, olha-lhe para os olhos, quando falares com mulher, olha-lhe para a boca… e saberás como te haver…
Que foi? Ah! quebrou-se a ponta do lápis?
Amanhã vancê escreve o resto: olhe que dá para encher um par de tarcas!

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