A música Bolicho é uma chamarrita que tem os versos do poeta Gilberto Carvalho e melodia de Cenair Maicá. Foi gravada pela primeira vez em 1983 no disco Canto dos Livres e é a 1ª música do lado B desse disco.

Bolicho é uma música em homenagem aos bolichos de campanha, aos armazéns, empórios, bodegas de interior que foram muito importantes para o desenvolvimento e manutenção dos povoados pelo Rio Grande adentro.

Esses bolichos se localizavam geralmente em locais estratégicos, entre um povoado e outro, na beira da estrada principal, perto da encruzilhada. Serviam inclusive como ponto de referência.

Pra quem conhece a música, sabe como ela narra bem o ambiente de um bolicho. Mostrando as várias faces desses empreendimentos, desde armazém até centro cultural da campanha.

Então bamo dar uma observada na letra da música pra ver mais detalhes dessa rica obra que descreve os detalhes e o ambiente desses bolichos.

No balcão cheiro de risos de tábua velha riscada
Maço de palha e o fumo numa estopa arremangada
Qüerada à muita cachaça e alguma rusga entaipada

O bolicho era um local de entretenimento, o povo ia pra se aliviar, passar o tempo, espairecer, por isso essa metáfora “o balcão cheio de risos”. Aí já começa a falar dos produtos, maço de palho e fumo pra um acender um crioulo. E diz que a qüerada,  a peonada que frequenta o bolicho toma muita cachaça. E de praxe, sempre tem alguns que não se gostam, mas que frequentam o ambiente, mas é melhor deixar essas rusgas entaipadas, quietas, estancadas.

O rádio que se desmancha num tangaço de Gardel
Peça de chita floreada, renda, alpargata e pastel
E um gato velho brasino que a cuscada dá quartel

Nesse verso ajudar a localizar que esse bolicho ficaria mais pra fronteira oeste, pois tava sintonizada numa rádio onde tocava um tango de Carlos Gardel.  Depois cita mais produtos que se vendia: tecido de chita floreada, rendas, alpargatas e pastel. Pra mostrar que além de trago e fumo, se vendia uns lanches e até produtos pro dia-a-dia como tecido e calçados.

E agora aparece um termo que muita gente me pergunta: Um gato véio brasino que a cuscada dá quartel. Dar quartel é dar abrigo, dar poso, cuidar. Então aqui a cuscada do bolicheiro até cuidava de um gato brasino.

Bolicho beira-de-estrada, na solidão da campanha
Onde o índio solitário afoga as mágoas na canha
Morada dos cruzadores, onde o andejo sem rumo
Busca na canha e no fumo matar saudades de amores

E pra aqueles vivente que tão há tempos na estrada, se sentindo perdidos, sem rumo ou aqueles que estão desiludidos com a vida amorosa, nada além da canha e do fumo pra curar essas saudades.

Lá fora a tava que sobe, cá dentro trago que desce
A goela da oito baixos canta até o que não conhece
Um truco bem orelhado mesmo em segunda amanhece

E no lado de fora do bolicho tinha uma cancha de tava, de jogo do osso. Então lá fora subia a tava pra se tentar sorte e dentro do bolicho era o trago que descia na garganta.

E quando se tinha uma gaita, ela tocava de tudo, mesmo até o que não se conhecia. Essa é uma máxima presente nos bolichos e bares até hoje. Vai dizer que tu nunca pediu uma marca pro cantador e mesmo não sabendo, deu um jeito de cantar pra ti! ahha.

E o truco bem orelhado, bem jogado, entra madrugada adentro, mesmo em uma segunda-feira, em dia de semana, de trabalho, amanhece o dia.

Ninguém passa sem chegar no bolicho beira-estrada
E o bolicheiro alarife tem a cara preparada
Às vezes sua livreta cobra quem não comprou nada

Quando tá cruzando a campanha e vê o bolicho, se chega pra dentro, seja pra uma canha, pra um pastel ou só pra dar uma descansada.

E fala que o bolicheiro alarife tem a cara preparada e as vezes a sua livreta cobra quem não comprou nada.
Alarife é sinônimo de esperto, só que no sentido de ladrão, trapaceiro, velhaco. Que tem a cara preparada, ou seja tem a experiência, sabe disfarçar e cobra mais do que devia. Não que sejam todos, mas devia acontecer com frequência, principalmente quando a clientela se perdia no trago!

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