Em assuntos de religião o gaúcho antigo entendia muito pouco ou quase nada. Batizava os filhos por costume ou tradição de família e sem conhecer o motivo deste sacramento.
Sabia que o Natal era dia de festa de gente rica. Dia em que se trocavam presentes. Porque faziam isto, não sabiam a razão. Da Páscoa tinham ainda menos noção. Ignoravam qual o motivo deste feriado.
O gaúcho só respeitava e acreditava na Sexta-Feira Santa. Este dia sim, para ele era e ainda é dia sagrado. Evitada toda briga ou discussão com quem quer que fosse, criança ou adulto.
Não ordenhava as vacas mansas nesse dia, receando que em vez de leite saísse sangue do úbere.
Era dia bom para se visitar algum amigo ou compadre na vizinhança, porém ia a pé, nada de montar a cavalo. Ao sair à pé pelo campo, levava uma varinha em vez de relho. Não usava o revolver; e faca só a pequena para cortar o fumo.
Na véspera procurava pescar no rio, sanga ou lagoa alguns peixes para não comer carne nesse dia santo. Nada risos ou de brincadeira. Evitava dizer palavrões. Mesmo que as crianças fizessem artes, não eram elas punidas. E também não se batia nos animais.
As mulheres aproveitam para sair pelo campo, em grupos e com as crianças a procura de ervas medicinais. Qualquer ‘jujo’ (erva, casca ou raiz) colhido na Sexta-Feira Santa tinha mais efeito como medicamento.
Nesse dia era de bom agouro matar uma cobra; e de melhor valia ainda se a cobra fosse morta por uma mulher.
Sábado de Aleluia era dia próprio para se expandir em alegria. E também para corrigir os filhos se culpados de alguma travessura feita no dia anterior. E também era dia para dar pau nalgum inimigo se fosse possível. Porém o melhor de tudo era aproveitar o Sábado de Aleluia para carnear alguma rês gorda para o rancho a fim de festejar e compartilhar da alegria que todo o cristão devia sentir nesse dia, mesmo que os gaúchos ignorassem a causa de tanto regozijo.
Trecho retirado do livro “Mala de Poncho – Reminiscências e Costumes Campeiros”, de Raul Annes Gonçalves.