Despachando a trote largo é uma chamarra que tem os versos e a melodia de Mateus Neves da Fontoura, foi lançada em 2009, no disco do Raineri Spohr: Por Campos e Galpões.

Depois teve outra versão lançada em 2018 no disco Na volta da estrada, onde o Raineri canta os poemas do Matheus Neves da Fontoura. Só que nesse disco o nome da música é Despachando um trote largo e tem novos arranjos.

Queria já deixar um agradecimento especial ao Matheus por ter me confirmado os detalhes a respeito dessa música!

Despachando a trote largo com a história de um guri que é mandalete, que busca na vila as coisas que o povo da estância pede. E o interessante é que tá cheio de produtos e termos campeiros.

Já vale contextualizar que essa história não se passa em um local definido. A história poderia ser em qualquer lugar de campanha. Tio Nico, Manuela, Tia Maruca, Selmar e até o personagem principal, o gurizito todos são fictícios, mas são iguais a tanta gente dessa terra gaúcha que bem conhecemos.

Despachando légua e pico ao trote largo
Vai de em pêlo num tostado o gurizito
Sabe o rumo do munício encomendado
Do bolicho de campanha do tio Nico

Pensa nessa primeira cena. Um guri, montado em pelo no seu cavalo, um tostado. Se botando na estrada, cruzando as léguas num trote largo. E só cabeça ele sabe o que precisa trazer, tem a lista, o munício bem decorado e tá indo pegar no bolicho do tio Nico.

Vai ralhando o velho cusco ventania
Galgo bueno pra correr lebre ligeira
Companheiro de caçada e anarquia
Que amarrou outra preá numa toceira

No caminho pro bolicho, vai ralhando com o seu cusco, que corre no costado. Que é um galgo, uma raça de cachorros que são velozes e muito utilizados nas corridas. E esse cusco é parceiro de caçada e de anarquia, de brincadeiras desse guri. E o cusco amarrou ou seja identificou um preá no meio das toceiras a beira da estrada.

A meia espalda leva a mala de garupa
Puxando a ideia pra lembrar da encomenda
Pois “Deus o livre” se esquecer da tia Maruca
Pediu três vela pra rezar noutra novena

A meia espalda ele carrega a mala de garupa e vai revisando na cabeça as coisas por que não pode esquecer das coisas e principalmente as vela da tia Maruca.

Cana das buenas pro Selmar lavar a goela
Mais querosena pra queimar na lamparina
Corte de chita pro vestido da Manuela
Batom carmim, água de cheiro e brilhantina

E segue os pedidos, canha pro Selmar, querosene, um corte de tecido, batom cor carmim, água de cheiro e brilhantina pros cabelo.

Se tiver fumo, sendo em corda e amarelito
O suficiente só pras uns nove ou doze baio
Quem encomenda recomenda ao gurizito
Se vai num passo volta noutro, piá lacaio

O fumo em corda amarelinho é uma marca de fumo e é só um pedaço, pra fazer uns nove ou doze baio. Baio é como é chamado o cigarro, pq a palha tem essa cor parecida com a pelagem baia.

E ainda dá uma gavada no gurizito que ele sempre faz o serviço certo e rápido. Eu até comentei uma vez com o Raineri que um dia um amigo me pediu a respeito da música que não entendia esse verso. Pialo e caio. Como bem vimos é piá lacaio. Lacaio é um servo, mas aqui tá usado no sentido de ser alguém que obedece e faz o serviço bem feito.

Umas bolitas porque ninguém é de ferro
E a nica-joga já anda meio judiada
Tudo arreglado com o tio Nico no caderno
e ao trote largo o gurizito pega a estrada.

E agora tem o pedido dele, as bolita, as bolas de gude. Nica-joga é aquele bolita tua preferida, a mais importante do saco. Eu lembro que eu tinha uma que era bem miúda e meio marrom avermelhada, da cor da terra, que dificultava o acerto do adversário.

E toda a encomenda ficava arreglada, anotada no caderno. Até por que não é prudente o guri carregar dinheiro estrada a fora.

Baita história, né! E de tão rica que ficou, o Mateus Neves da Fontoura escreveu algumas continuações desses versos. Em 2012, a música “Na volta da estrada”, concorreu no 12º Um canto pra Martin Fierro, de Santana do Livramento. E essa marca tá no álbum de mesmo nome do Raineri Spohr e conta que a entrega foi tudo cento por cento. “Não faltou nem um mandado, não sobrou nos anotado, tudo medido e certito.” E vai narrando como que o povo, utilizou os munício que ele levou e que no fim do mês vai ter outra encomenda.

Depois em 2019, foram lançadas as marcas: “Manuela” e “O Selmar e o tostado” que concorreram na 2ª edição do festival Canto da Carreta, em São Gabriel. E Manuela ficou com o 1º lugar. Só que essas duas marca ainda não estão disponíveis nas plataformas pra gente ouvir.

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